terça-feira, 9 de agosto de 2016

#70 Lendo: O Corcunda de Notre Dame

Sinopse: "Na Paris do século XV, a cigana Esmeralda dança em frente à catedral de Notre Dame. Ao redor da jovem e da igreja, dançam outros personagens inesquecíveis - como o cruel arquidiácono Claude Frollo, o capitão Phoebus, a velha reclusa Gudule e, claro, o disforme Quasímodo, o corcunda que cuida dos sinos da catedral. Com uma trama arrebatadora, que tem a cidade de Paris como bem mais do que um mero pano de fundo, Victor Hugo criou um dos grandes clássicos do romantismo francês, de leitura irresistível.”

Autor: Victor Hugo

O Corcunda de Notre Dame é um livro que eu sempre tive um pé atrás pra ler por conta das adaptações – que já são, de certa forma, sombrias, e mesmo assim são BEM mais leves que a história original –, mas resolvi arriscar depois da leitura de Os Miseráveis. E, cara, valeu a pena. Victor Hugo é um dos meus autores preferidos e é INCRÍVEL como ele consegue(ia) fazer você amar e odiar o mesmo personagem ao longo da história, rir, chorar e ainda aprender sobre o universo e tudo o mais.

O livro tem como protagonista a catedral de Notre Dame. É. Entre os personagens, alguns viram conhecidos do leitor – além do corcunda, Quasimodo, Esmeralda, Phoebus e Claude Frollo, temos também em destaque Jehan, irmão mais novo do Frollo e Pierre Gringoire, filósofo e escritor -, e se revezam no papel de protagonistas, apesar do narrador acompanhar mais o Pierre e os Frollo. O mais difícil, na verdade, foi me desprender das versões dos personagens no desenho da Disney e no musical (que também é da Disney, mas é bem mais próximo da história original), mas ADORO que Victor Hugo não coloca realmente ninguém como vilão ou herói – aliás, Quasimodo é provavelmente o único mais “neutro” nessa história toda, o que mais sofre e TE faz sofrer junto.

A história começa com um dia de festa na igreja, cujo centro era, inicialmente, uma peça escrita e coodernada por Pierre Gringoire – que começa escritor, vira poeta, filósofo e vagabundo ao longo da história -, quando, por uma série de acontecimentos bizarros, vira o tal dia de festa onde escolhem o “papa dos loucos”, sendo que o rei dos loucos é Clopin Trouillefou. Quasimodo está por ali, meio por acaso, e logo é eleito o papa por ter a melhor/maior/pior “careta”. Além de corcunda, o leitor logo descobre que Quasimodo é cego de um olho, tem as pernas tortas, mal fala e ficou surdo ainda criança por causa dos sinos da catedral. Mesmo assim, ele ama a catedral e tem uma lealdade incomparável ao arquidiácono Frollo – crescendo na torre dos sinos, os anjos, santos e gárgulas do topo da catedral são seus amigos e protetores.

Aliás, aproveitando aqui para falar sobre o Quasimodo, acho que o arco dele é o mais triste de todos - a Esmeralda que é a condenada à morte, Claude que tem o drama de amar alguém, Jehan que passa fome, mas Quasimodo é o mais triste -, porque, além das deficiências físicas, ele sofre com o preconceito de toda a sociedade, não faz mal pra ninguém e ainda é visto como vilão, é preso porque ele é surdo e o juiz também (e até contam isso para o juiz, mas, sendo surdo, ele simplesmente chuta que estavam aumentando as acusações e condena o Quasimodo a passar por uma hora a mais de tortura), salva as pessoas e é visto como o culpado mesmo assim... E a história da infância dele por si só é de partir o coração. O único sorrisinho que ele dá é justamente quando é eleito papa dos loucos, em toda a história.

Enquanto Quasimodo era carregado pela multidão feseira e Gregoire vagava pela cidade, Esmeralda dançava na rua com sua cabrinha Djali, e Frollo observava. Esmeralda é uma figurinha aqui, ela é descrita como uma menina de cerca de 16 anos, linda e carismática, sempre com sua cabrinha de “chifres de ouro”. Ao longo do livro, a história da Esmeralda é contada e algumas coisas vão fazendo mais sentido – ela tem momentos de misericórdia extrema, como quando se casa com Gringore para que ele não seja enforcado pelos outros ciganos, e momentos de egoísmo extremo, como quando grita com Quasimodo porque ele voltou sem o Phoebus para perto dela -, e acho que o mais interessante é que muito da Esmeralda do desenho e do musical fizeram mais sentido depois de ler o livro. xD Ao mesmo tempo, ela foi uma das personagens que eu amei e odiei no espaço de 50 páginas.

Os Frollo são personagens absolutamente interessantes. Claude, o arquidiácono, tem tudo para ser um vilão de fato, ele persegue a Esmeralda, é cruel com o Quasimodo, odeia os ciganos, usa dois pesos e duas medidas. Mas o livro traz a história dele, e a verdade é que ele sobreviveu a muita coisa e foi muito bondoso – os pais morreram quando ele tinha 19 anos (se não me engano, er), ele cuidou sozinho do irmão, que virou bem o contrário do que Claude esperava, e adotou Quasimodo quando ele apareceu na igreja, uma criança feia chorando e abandonada, que alguns falavam que devia ser sacrificada. Bem diferente de Claude, Jehan tem amigos por toda a Paris, abandonou tanto os estudos quanto a religião e vive mais entre os ciganos que entre os clérigos. Ele aproveita sempre que pode para pedir dinheiro para o irmão e fazer algum tipo de chantagem emocional que mostra de novo o lado sensível do Claude, que o ajuda.

E, por fim, temos o que, pra mim, seria o vilão real da história: Phœbus de Châteaupers. Se o fizeram herói no desenho e no musical, ele tá beeem longe disso no livro. Na verdade, metade das desgraças que acontecem na vida da Esmeralda e do Quasimodo são causadas pelo Phoebus. Ele salva a Esmeralda de ser raptada pelo Frollo e pelo Quasimodo, e ela quase automaticamente se apaixona por ele – e está aí algo que eu detesto na Esmeralda, esse amor platônico desesperado. Ele, que estava noivo, vai pra cima dela mesmo e causa a fúria do Frollo, que faz com que a Esmeralda seja acusada de assassinato (do Phoebus), fala que o soldado morreu, deixa ela desesperada... Se o Frollo vira o vilão, é por causa do Phoebus mesmo. O pior é que o infeliz sobrevive e vê de camarote o caos em Paris depois.

No geral, o livro é lindo e triste. Os personagens são incríveis, com qualidades e defeitos, histórias de origem e complexos como qualquer humano. Mas minha parte preferida é como a catedral é claramente a protagonista. Um dos livros inteiro é dedicado à arquitetura de Notre Dame, as modificações que ela sofreu ao longo dos anos e seus arredores – Paris vista do topo da catedral. Fora os contextos históricos que eu nem sei se são realmente históricos, mas são tão bem escritos e tão detalhadinhos que eu totalmente acredito que são reais.

O Corcunda de Notre Dame é, num geral, dolorido, não só não tem final feliz como os personagens são dolorosamente reais, humanos, falhos. Mas é absurdamente bem escrito, envolvente e LINDO como Victor Hugo sempre consegue(ia) fazer. Não é à toa que é clássico. ;)

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